quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Cap'3 - De volta à realidade (pt. 3)

No dia em que se acorda fatal, tudo dá certo.

Quem fala isso é o Richard, claro. Típica frase dele que serve pra qualquer um que por algum motivo, queria ficar mais cinco minutinhos na cama. Ele diz que quando a gente acorda fatal, nunca mais podemos dormir porque se não... Não fica mais fatal. Isso era um discurso vago e inventado por uma diva com vontade de fazer compras de madrugada. Com muito custo e um leve empurrão dele (que poderia ter derrubado o muro de Berlim), me aprontei e nem me olhei no espelho, já que tinha um personal stylist no meu quarto. Saímos de casa e andamos no shopping até ele encontrar uma camiseta onde se via escrito, claro, em rosa: I'm addicted do JW. Estávamos numa loja chamada JephiWallet. As iniciais vinham daí. Mas a paixão falou mais alto no coração e na cabeça da diva que leu "Sou viciado em JUDY WILSON". Não quis discutir, já que ele estava apaixonado pelo tal do cabeleireiro. Ter um amigo gay e uma amiga modelo é difícil para uma jornalista. Tem que ter um lado psiquiatra também. Richard resolveu experimentar a camiseta e eu arranjei um banquinho na loja para me sentar. Ia dormir ali, se não fosse pela música ensurdecedora que tocava dentro da loja. Tentei prestar atenção em alguma coisa pra não cair no sono. Depois de muita soneira, percebi que um dos vendedores vinha em minha direção. Wow! Ele era simplesmente magnífico! De uniforme que era uma calça preta e uma blusa branca. E eu provavelmente com uma roupa qualquer, uma cara de sono e quase dormindo no meio da loja. Dei um jeito de acordar e ele logo veio me cantando. Ok, ele não veio me cantando.

- Oi posso ajudar? - claro! Eu vou querer ver o preço de, vamos ver, você!
- Oi, não obrigada, eu estou esperando um amigo meu. - falei meio sem graça, ficando vermelha como sempre. Porque eu fico vermelha de ás vezes nem tenho vergonha? Mas, nesse caso eu tava com vergonha, afinal eu tinha acabado de acordar, e nem me olhei no espelho!
- Ok, mas precisando de mim é só ligar. - típico discurso de vendedor né, se precisar é só ligar! Ligar? Ligar pra onde?
- Ãn?

Ele sorriu e saiu para atender outra cliente. Eu fiquei encarando ele um bom tempo, até ele colocar a mulher pra dentro do provador e olhar pra mim de novo com aquele sorriso. Sabe? Aquele sorriso do tipo "to te paquerando, sua sonsa". E a sonsa com cara de tacho à uns 15 minutos. É, eu estava realmente fatal! Meu suicídio social ia ser fatal, eu ia ficar solteira pra sempre! Ele acabou de atender a moça e logo veio em minha direção de novo. Richard a essa hora estava engatado num papo provavelmente sobre o Judy Wilson com o outro vendedor, aparentemente diva como ele. O loirinho veio chegando perto e me encontrou com um sorriso menos retardado como o que eu estava anteriormente.

- Me desculpa, eu disse pra você ligar mas não te dei meu telefone!

O quê? eu estava ganhando um loiro lindo fácil assim? Que manhã maravilhosa! Será que ele ia fazer alguma brincadeira? Dar o telefone do amigo mais feio e mais encalhado dele? Agora eu tava com a cara de retardada de novo, e ele com o sorriso lindo de novo, enquanto escrevia o número num papel. - Toma. - ele estendeu o papel com o nome Johnny e um número de celular.

- Ah, claro. Meu nome é Rebecca, se você quiser saber - ele riu e ficou mais lindo, se isso é possível.
- Porque você não me dá seu telefone Rebecca? Assim posso ligar pra você, pra combinarmos de sair pra tomar um café, você gosta?
- Claro! É 765-873-879. - eu estava com cara de boba diante dele. Ele mal sabia meu nome e já estava querendo meu telefone pra sair e tomar um café. Aquilo só podia ser brincadeira. Ele ia me seqüestrar, é claro. E ia cortar meus dedos e mandar pro Richard em saquinhos cor-de-rosa. Meu Zeus, Rebecca, pára com esses pensamentos idiotas!
- Então, tenho que trabalhar! Te ligo mais tarde pode ser?
- Pode ser sim. - eu estava menos boba mais ainda mantinha o sorriso, afinal se eu fosse simpática talvez ele não cortaria meus dedos.

Richard enfim comprou tudo que queria, e saímos da loja. Contei sobre o Johnny pra ele que disse que havia percebido o interesse do loirinho por mim logo quando entramos na loja e eu sonsa estava cochilando no banquinho. Me pergunto: o quê esse cara viu em mim? Uma garota com cara de sono, cabelo bagunçado, roupa que não combinava com o sapato e um amigo gay comprando tudo rosa. Passei em frente a uma vitrine e finalmente me olhei. Fiquei absurdamente encantada com meu reflexo. Modéstia parte eu estava realmente fatal. Meus sapatos combinavam com minha roupa, meu cabelo, apesar de bagunçado, estava impecavelmente belo, minha cara parecia a da Geri quando ela saiu na Vogue (ok, menos linda, bem menos) e eu estava com o sorriso mais feliz do mundo. Eu estava linda! E estava me achando assim. Eu estava f-a-t-a-l! E naquele dia, tudo ia dar certo! E já tinha começado a dar certo! Primeiro, o vendedor lindo. Depois, a fila do BurguerKing estava mínima à minha frente (e imensa atrás de mim), todas as roupas bonitas, baratas e que o Richard não criticou serviram pra mim e, por fim, vimos o Orlando Bloom numa loja. Ok, o Orlando Bloom foi a melhor parte do dia! Meu Zeus, que homem é aquele? Ai.. como é bom morar em Londres!

Já era mais de meio dia quando Richard resolveu parar de contar fofocas sobre Britney Spears, Amy Winehouse e outras milhares de famosas que eram notícia no dia, e almoçamos tranquilamente no Cardeal. Estava tudo correndo normalmente (exceto o fato de Rebecca Dickens estar perfeitamente simples e maravilhosa, com roupas magníficas na bolsa de compras e com a imagem intacta de um Orlando Bloom dando uma olhada nas bermudas caqui da parte de trás daquela loja na cabeça. Isso tudo segundo palavras do Richard) quando meu celular tocou. Ele é um pouco escandaloso sabe? Ainda mais quando se está dentro de um restaurante onde se escuta apenas os barulhos dos garfos arranhando de leve os pratos. Quando olhei no visor estranhei porque não conhecia o número, mas logo caiu a ficha de que a algumas horas atrás eu tinha dado o meu número para o vendedor mais lindo daquele shopping. Fiquei muito nervosa antes de atender mas, por incrível que pareça, agi tranquilamente no telefone. Richard tem razão. Quando acordamos fatais, tudo dá certo!

- Alô?
- Oi, é a Rebecca?
- Sim, quem é? - fiz aquela voz desinteressada, é claro.
- Bem, não sei se vai se lembrar de mim, é o Jhonny, da JephiWallet. Nos conhecemos na loja hoje de manha e você... - é claro que o interrompi pra fazer um comentário me achando a mais má das mulheres.
- Ah, sim, me lembro! Não faz muito tempo isso não é verdade? - ai, que má!
- Er.. Me desculpe, mas como eu disse que ia ligar... err... gostaria mesmo de tomar um café com você, é claro, se for possível, e se você quiser... - interrompendo de novo, malíssima!
- Tá, vamos tomar o café. - claro que não! Eu acabei de almoçar, não quero café!
- Que ótimo, onde você está? Não posso demorar muito, estou no meu horário de almoço.. sabe como é...
- Ah, pois é. Eu tô no Cardeal, se você quiser vir até aqui, por mim tudo bem.
- Claro! É bem perto daqui, estarei aí em um minuto!

É claro que Richard estava escorando na mesa pra poder ficar mais perto do celular e conseguir alguma informação sobre a ligação. Mas logo depois que desliguei, ele, não se contentando em ter ouvido tudo que o tal Johnny tinha falado no telefone, me faz a pergunta: "E aí o que ele falou?" como se não soubesse exatamente do mesmo jeito que eu, o que Johnny tinha falado. Esperamos alguns minutos e lá estava ele, na porta do restaurante, impaciente, prestes a pegar o celular e me ligar pra saber onde ou estava. Mas não foi preciso pois logo que colocou a mão no bolso, me viu saindo com Richard. Nos cumprimentou como se eu fosse Demi Moore e Richard, Ashton Kutcher. Com os olhos brilhando iguais os de Richard quando vimos Orlando Bloom. Fomos caminhando até o café onde ele queria me levar, e Richard foi atrás. Chegando lá tive que dar uma diretíssima na minha diva do tipo: 'Richard, sai daqui? Obrigada'. E ele ainda demorou pra entender. Além de diva, é lerdo. O café era um lugar aconchegante. Haviam alguns casais em mesas diferentes e as paredes eram enfeitadas com coraçõeszinhos. Tudo muito romântico, eu hein. Quando vi que estava tudo lindo, me dei conta de que eu já havia constatado que aquilo era uma brincadeira de mal gosto. E ele ia me seqüestrar mesmo! Meu Zeus! Eu estava num café aconchegante com um Johnny lindo, vendedor de loja de roupa, prestes a morrer sufocada! Que drama Rebecca! Páre, já está passando dos limites! Ok.

Ele pediu um capuccino gelado e me deixou à vontade para pedir a mesma coisa, já que eu amava capuccino com sorvete. Ele ainda não tinha direcionado nenhuma palavra a mim. Pelo menos não diretamente. Parecia hipnotizado pelos coraçõeszinhos, ou pela música dos Hanson que tocava lá dentro. Ou quem sabe pela minha cara de idiota pensando essas coisas ao invés de puxar papo?

- Seus olhos não me deixam dizer nada - uau! Recitou um poema!
- Que isso! Não é pra tanto! Não sei o que você viu em mim, sinceramente! - se é pra ser fatal, vamos ser fatais mesmo não é?
- Bom, eu vi essa mulher linda que você é, ora.

Meu lado fatal, má, ou qualquer coisa negativa ficou esmagado debaixo do enorme sorriso idiota que eu deu sem querer depois de ouvir isso. Parecia brincadeira, mas estava acontecendo mesmo! E eu não podia estragar aquilo com o sorriso mais bobo da face da terra. Então resolvi voltar a ser fatal.

- Obrigada - pra não falar o que eu queria fiquei quieta mesmo.
- Você tem namorado Rebecca?
- Lógico que não... - ah, pronto. Que resposta desesperada é essa? 'Lógico que não'? Só faltou dizer 'você quer namorar comigo?'. Rebecca você é patética ao extremo! - ...que não vou responder antes de você.
- Eu não tenho namorada, terminei um relacionamento de dois anos à alguns meses... E então?
- Eu também terminei faz pouco tempo, mas não queremos falar disso, não é?
- Eu prefiro falar de relacionamentos futuros, a falar de relacionamentos passados. - a cara de safado que todo homem sabe fazer reinava na minha frente.

Depois de conversamos um tempinho, descobri que ele é aspirante à ator, fez umas propagandas para a JephiWallet, gosta de música clássica, e mora com o cachorro numa rua perto da - adivinhem - minha. O tempo era bem curtinho mesmo, pois ele tinha que voltar ao trabalho, e eu tinha que procurar um também. Me convidou para sair na quinta feira e eu sem pensar, aceitei claro. Mas depois de alguns segundos após o 'sim', me lembrei do teste na boate. Quinta era o único dia de folga dele, então, não hesitou em aceitar ir à boate e me ver fazendo drinks. O que me deixaria mais nervosa e mais propícia a quebrar as coisas do lugar e consequentemente não levar o emprego. Mas, pensando bem, vão ter centenas de pessoas lá e um a mais, um a menos não ia fazer diferença.

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